No último final de semana, os veículos de imprensa do estado repercutiram a pesquisa Retratos de Leitura do Instituto Pró-Livro (IPL), datada de 2020, que voltou a ser divulgada em razão de uma matéria recente da Revista Bula: segundo o levantamento realizado àquela altura, João Pessoa era a capital brasileira que mais lia. O dado reproduzia a proporção de 64% de leitores entre os moradores locais, conforme entrevistas realizadas pelo Ibope Inteligência.
A quinta edição do Retratos da Leitura foi realizada um ano antes de sua difusão, em 2019, tendo como amostragem 8.076 pessoas em 208 cidades. Em relação ao índice de leitores por número de habitantes, João Pessoa, com 64%, estava à frente de Curitiba (63%), Manaus (62%), Belém (61%) e São Paulo (60)%.
Na capital paraibana, o número estimado de pessoas que consumiram pelo menos um livro nos três meses anteriores à pesquisa era de 480 mil pessoas. Desse montante, a maioria era do sexo feminino (56%), com idades entre os 18 e os 39 anos (41%), pertencentes à classe C (41%) e que haviam concluído o ensino superior (38%).
A leitura dos pessoenses era alimentada por gosto (26%) e crescimento pessoal (22%), principalmente. Do outro lado, dentre os que não leem, o principal motivo para a ausência desse hábito no cotidiano era a falta de tempo (45%).
A Revista Bula atribuiu, erroneamente, as porcentagens referentes às capitais brasileiras à sexta edição do Retratos da Leitura, cujos resultados vieram a público bem depois, em novembro de 2024, com 5.504 entrevistados em 208 cidades. O estudo mais recente não publicizou números por capitais: o índice foi descrito por estado e a Paraíba estava com um percentual de leitores de 38%.
Uma informação preocupante levantada pelo IPL no ano passado ganhou destaque na imprensa: no Brasil, o número de pessoas que não lê (53%) ultrapassou o número de pessoas que lê (47%). Considerando o Nordeste, a porcentagem de leitores caiu de 48% para 43%. A estimativa é que entre 2015 e 2024, 3 milhões de nordestinos deixaram de ler com a frequência estipulada pela pesquisa (ao menos um livro inteiro no último trimestre). Em relação às outras regiões brasileiras, apenas o Centro-Oeste oscilou positivamente — de 46% para 47% em relação ao índice de leitores; Norte, Sul e Sudeste também assinalaram queda.
Clubes de leitura
O autor campinense Bruno Ribeiro assevera o incremento do consumo de livros graças ao aumento do número de eventos literários nas cidades paraibanas, incluindo a capital, dentre outras ações: “Nós temos, em João Pessoa, uma especialização em escrita criativa, coordenada por Débora Gil Pantaleão, assim com as editoras independentes, que estão surgindo cada vez mais e com qualidades muito boas”.
Ana Adelaide Peixoto, cearense radicada na Paraíba e colunista de A União, também celebra o índice apontado em João Pessoa em 2019, atestado por ela na observação dos clubes de leitura da capital, que cresceram a olhos vistos. Mas o interesse das novas gerações por esse hábito ainda precisa ser reconquistado, segundo a cronista.
“A forma de se comunicar, de se informar ou até mesmo do devaneio, mudou. Hoje, tudo é no mundo digital”, diz ela. “E manter o jovem nas páginas é tarefa quase impossível, uma vez que ele tem o mundo no fone. Tudo se perde diante do assombro de ter o mundo ao seu redor”.
Os editores também comemoram o percentual positivo a nível municipal. André Ricardo Aguiar, responsável pela editora Dromedário, mostrou-se surpreso com os números, mas diz que eles fazem sentido no cenário contemporâneo e revela-se otimista com o horizonte que pode ser construído coletivamente. O literato numera medidas para manter ou expandir os índices registrados.
“Políticas culturais acima de tudo. Um maior incentivo via educação, investimento em bibliotecas comunitárias e ações sobre o livro e a leitura. Todas essas práticas podem ser multiplicadas. Ler é um direito humano”.
O gerente executivo da Editora A União, Alexandre Macêdo, endossa a satisfação pelos números encontrados na capital há cinco anos, destacando a vocação da cidade em relação à cultura, incentivada, por exemplo, em concursos para novos escritores. A Livraria A União, situada no Espaço Cultural, em João Pessoa, também avalia a produção literária na Paraíba e a sua divulgação.
“Uma iniciativa nossa que merece destaque é o projeto Paraíba na Literatura, uma coleção que homenageia vultos da literatura paraibana, que são perfilados por nomes ligados à área das letras. No final deste ano, será lançada a sua sétima edição”, lembra Alexandre.
Três livros por mês
“Estrelas” da pesquisa do Instituto Pró-Livro, os leitores pessoenses garantem os números registrados pelo Retratos da Leitura, mas ressalvam que o consumo ainda pode ser ampliado. A jornalista Bruna Fernandes lê em média três livros por mês, com preferência pelo gênero policial.
- A jornalista Bruna Fernandes vê os números refletidos em sua família e amigos | Foto: Arquivo pessoal
“As pessoas próximas a mim refletem o que a pesquisa mostrou, pois tenho amigas, colegas do clube do livro, família (pai, mãe, irmã, marido) que são leitores de fato. Porém, ainda sinto que isso é algo meio limitado, porque, em paralelo aos que leem, percebo muitos outros que nunca pegam em um livro por prazer”, afirma.
O advogado Francisco Alves chegou a manter um número de 100 títulos lidos em um ano, índice que foi diminuindo com o passar do tempo, mas que foi sustentado pela literatura em diversas formas — tanto nos convencionais livros físicos quanto nos audiobooks. Tem predileção pelo terror, mas dá oportunidades para a descoberta de clássicos como Dom Quixote, de Miguel de Cervantes.
“Mesmo que a cidade já tenha tido mais livrarias, ainda vejo muita gente comprando livros. Me parece um hábito que, mesmo diante de tantas redes sociais e serviços de streaming, continua forte”, opina.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 8 de julho de 2025.