Notícias

songbook

Seleção musical de cinco décadas

publicado: 04/06/2025 09h41, última modificação: 04/06/2025 09h41
Milton Dornellas lança hoje, na Livraria A União, livro com letras e partituras de 14 de suas canções
2025.05.23 Milton Dornellas © Leonardo Ariel (4).JPG

“Música Artesanal” é o título da publicação lançada pela Editora A União e que traz a obra de Dornellas | Foto: Leonardo Ariel

por Esmejoano Lincol*

A intuição tem sido o sentimentoguia de Milton Dornellas em 50 anos de música. O fluminense radicado na Paraíba aprendeu a tocar e aperfeiçoar suas técnicas de composição por meio da própria experiência, carregando consigo influências diversas, que vão dos movimentos populares, como a folia de reis, ao rock’n’roll dos Beatles. Todo esse trabalho foi reunido em um livro de partituras, com subtítulo que resume sua labuta constante e ”braçal”: Milton Dornellas – Música Artesanal ganhará um evento de estréia hoje, a partir das 19h, na Livraria A União, no Espaço Cultural, em João Pessoa. A entrada é franca.

O lançamento contará com as participações de Adeildo Vieira, músico; Ana Lia de Almeida, professora; André Cananéa, gerente executivo de conteúdo e programas da Parahyba FM 103.9; e Naná Garcez, diretora-presidente da Empresa Paraibana de Comunicação (EPC). Esse projeto da Editora A União reúne 14 partituras de composições autorais de Milton, solo ou em parceria, e de diversas épocas, escolhidas conforme sua prévia catalogação. Os documentos foram editorados pelos músicos Uaná e Rudá Barreto; os arranjos ficaram a cargo de Uaná e de Sérgio Gallo; e a produtora Adriana Pio assina a apresentação do livro.

A empreitada perfaz uma iniciativa ainda maior, encampada pelo próprio Milton, que pretende organizar sua obra por meio dessas publicações — os songbooks — e da inclusão de seus discos, a exemplo de Mandrágora (1993), em plataformas de músicas.

“Já temos cinco álbuns no formato digital, mas ainda faltam alguns. Todas essas músicas são importantes porque elas fazem parte da minha história. E percebi que isso serve para que os colegas não sejam negligentes com suas obras. Descobri, afinal, que tenho material para fazer pelo menos mais 10 livros desses”, pontua.

Osmar e Monte

Mesmo asseverando a importância de todas as faixas para a sua carreira como músico e arranjador, Milton destacou três canções presentes em Música Artesanal. “A ira da íris”, por exemplo, foi composta com o pessoense Pedro Osmar, seu amigo de longa data e parceiro na criação do coletivo Musiclube, nos anos 1980.

“Essa música data, provavelmente, da primeira metade da década de 1990. Falamos da preocupação com a natureza, que é eterna. Pedro tem canções belíssimas que já foram gravadas por Amelinha, Zé Ramalho... Experimentamos muitas coisas juntos, desde a estética à militância político-cultural”, assinala.

“Madrágora”, é uma das cinco faixas escritas com Ronaldo Monte, escritor alagoano falecido em 2018 e um de seus maiores parceiros. O disco homônimo tornou-se um “clássico cult” nas palavras de seu intérprete, sendo comercializado, em formato físico, por mais de mil reais, conforme registro no site Discogs.

“Ela é uma das músicas que mais representa a minha obra. E Ronaldo está sempre presente, porque toda vez que eu toco essa, ele está comigo. Para a mesa de lançamento do livro, eu convidei a professora e escritora Ana Lia de Almeida, que é filha dele”, informa.

Por fim , “Se quiseres”, contém letra do poeta paraense Joãozinho Gomes — foi um presente para Milton, que o conheceu ao fazer um show no Amapá, há alguns anos — “um contato breve, mas intenso”, revela o artista. Faz parte de Senderos, seu disco mais recente.

“Fui informado de que pelo menos aqui na Paraíba é o primeiro songbook de um compositor que não tem vínculo com gravadora, enfim, da cena independente mesmo. É uma afirmação do que a gente faz. A gente acredita nisso e perpetua. Fui assim a vida toda”, atesta.

Sem fugir da IA

A música repousa no sangue de Milton Dornellas. Seu avô, José Fernandes, foi saxofonista na banda da Polícia Militar da Paraíba. Todavia, a convivência com ele foi diminuta. O jovem artista começou a dedilhar instrumentos apenas quando fixou morada no Nordeste, para onde se mudou com a mãe e o pai — este paraibano nato.

“Tive a oportunidade de ouvir mais músicas do que quem está começando a ouvir agora e testemunhei muitas coisas quando elas ainda estavam sendo feitas — Os Mutantes, O Terço, Belchior. Assisti Lenine e Elba Ramalho tocando numa salinha pequena do Teatro Piollin, na capital”, rememora.

Milton confidencia que seu estudo formal da música foi interrompido algumas vezes ao longo de sua vida, e que foi suprido, nesse sentido, por sua trajetória nos palcos e nos estúdios. Mas atuando como gestor do Programa de Inclusão Através da Música e das Artes (Prima), do Governo do Estado, Milton pôde oportunizar aulas de instrumentos clássicos a milhares de alunos, em 14 municípios paraibanos. “Sei da dimensão desse projeto, a nível nacional, inclusive. Eu ando em média dois mil quilômetros todos os meses, de carro, por todos os pólos do Prima, vendo as potencialidades e apontando caminhos”, indica.

Ao trazer a público um livro subtitulado Música Artesanal, Milton ratifica a importância da participação humana nas artes, mas não fecha os olhos para o uso da inteligência artificial — uma tendência da qual não se pode escapar, considera o instrumentista.

“A Revolução Industrial foi assim. Sair do artesanal para o industrial foi um trauma, mas depois nós nos acostumamos. Eu já nasci dentro da era industrial. E essa garotada está nascendo na era digital. Ainda assim, considero um desperdício não passar pelo exercício laboral da música. E acho que sempre terá alguém com curiosidade de fazer isso”, finaliza.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 04 de junho de 2025.