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764.758 animais

Caprinocultura recria o Semiárido

publicado: 08/07/2025 09h12, última modificação: 08/07/2025 09h12
Paraíba lidera o ranking nacional de produção de leite de cabra, com 5,627 milhões de litros por ano
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Ao todo, 223 municípios da Paraíba exploram a atividade, somando 78.773 propriedades rurais com criação de caprinos | Foto: Divulgação/Empaer

por Lilian Viana*

Num cenário de solo seco e clima desafiador, a Paraíba vem transformando o que antes era obstáculo em oportunidade. O estado, que hoje lidera o ranking nacional de produção de leite de cabra, alcançou a impressionante marca de 5,627 milhões de litros por ano, consolidando a caprinocultura como um dos motores da economia agrícola do Semiárido nordestino.

O crescimento expressivo do setor tem alterado a paisagem do Cariri paraibano, onde cada vez mais produtores rurais estão substituindo vacas por cabras para garantir renda e resiliência frente à escassez de água. Segundo dados do Boletim Técnico do Agronegócio Rebanhos da Paraíba, elaborado pelo Sebrae-PB, o rebanho caprino cresceu 30,7% nos últimos cinco anos, enquanto o bovino avançou 13,1% no mesmo período. Hoje, a Paraíba possui 764.758 caprinos, sendo o quinto maior estado em número de animais e o primeiro na produção de leite de cabra.

Esse avanço não se deu por acaso. É fruto de um conjunto de ações coordenadas que envolvem pesquisas de melhoramento genético, assistência técnica especializada, abatedouros, cooperativas e políticas públicas, com destaque para o trabalho da Empresa Paraibana de Pesquisa, Extensão Rural e Regularização Fundiária (Empaer), vinculada à Secretaria de Desenvolvimento da Agropecuária e da Pesca (Sedap) da Paraíba.

Atualmente, 2.984 famílias estão cadastradas no Programa de Aquisição de Alimentos — Leite (PAA Leite), sendo que 1.162 delas fornecem diretamente ao programa. Em 2024, o Governo Estadual comercializou R$ 16,2 milhões em leite de cabra por meio da iniciativa, promovendo segurança alimentar e renda para centenas de comunidades rurais.

O impacto social e econômico da caprinocultura é visível em cidades como Monteiro, São João do Tigre, Sumé, Serra Branca e São Sebastião do Umbuzeiro — que lideram o ranking estadual de rebanho caprino. Só Monteiro, por exemplo, possui 36,9 mil cabeças, seguido de São João do Tigre, com 27,9 mil, e Sumé, com 27,4 mil.

Em muitas dessas localidades, a caprinocultura representa até 70% da renda das famílias rurais. A atividade não só contribui para diminuir o êxodo rural, como também promove sustentabilidade agrícola, já que os caprinos se adaptam melhor ao bioma da Caatinga e demandam menos água e alimentação que o gado bovino.

Ao todo, 223 municípios da Paraíba exploram a atividade, somando 78.773 propriedades rurais com criação de caprinos, segundo dados da Defesa Agropecuária da Sedap. Somando caprinos, ovinos e bovinos, o rebanho paraibano ultrapassa os 10 milhões de animais.

Nova fase

Foto: Divulgação/Empaer

O fortalecimento da caprinocultura no Semiárido paraibano não se limita aos grandes números de produção. Uma nova frente de expansão tem ganhado força em municípios como Aroeiras, Gado Bravo, Caturité e São Domingos, onde 21 produtores iniciaram a transição da bovinocultura para a criação de cabras leiteiras. A mudança é reflexo direto dos incentivos governamentais e da assistência técnica oferecida pela Empaer, que tem orientado os criadores sobre as vantagens produtivas e econômicas da atividade, segundo o assessor em caprinocultura da Empaer, Geneilson Evangelista.

Com o preço do litro do leite de cabra atingindo R$ 4,80, a atividade passou a representar uma alternativa lucrativa para agricultores familiares. Em Gado Bravo, por exemplo, 10 criadores formaram uma associação e devem comercializar até 30 litros por dia, o que representa um reforço significativo na renda local.

A ação conjunta entre políticas públicas — como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA Leite) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) — e o suporte técnico oferecido no campo reforçam a caprinocultura como estratégia de desenvolvimento sustentável, inclusão produtiva e combate à insegurança alimentar no Semiárido da Paraíba. “Quem está investindo nessa área, seguindo as orientações e a assistência técnica da Empaer e de outros órgãos, vai ganhar dinheiro. Sem contar que o leite, adquirido pelo governo por meio dos programas de compras governamentais, vai para as famílias de baixa renda, integrantes do Cadastro Único”, ressalta Evangelista.

Além da comercialização, o apoio à cadeia produtiva vem sendo ampliado com a atuação de abatedouros especializados, como o Capribom, em Monteiro, e com a presença de cooperativas que garantem mercado para leite e carnes caprina e ovina. A Empaer também está conduzindo um diagnóstico com cerca de 65 mil produtores rurais, para avaliar a possibilidade de isenção da tarifa de energia elétrica, reduzindo custos e incentivando ainda mais a produção.

Do Sertão para o Brasil

No Sertão seco e pedregoso de Barra de São Miguel, no Cariri paraibano, o produtor Pedro Pedrosa encontrou na caprinocultura um caminho para transformar desafios em excelência. À frente da Fazenda Coruja, ele conseguiu romper barreiras regionais e culturais com um produto que carrega não apenas sabor, mas identidade: o queijo de cabra artesanal. “O Selo Arte foi um divisor de águas. Abriu as portas do mercado nacional para a gente, valorizando um queijo feito com cuidado e sem conservantes”, destaca Pedro. 

Sede da Fazenda Coruja, que conseguiu romper barreiras regionais com um produto que carrega não apenas sabor, mas identidade: o queijo de cabra artesanal | Foto: Arquivo pessoal

Zootecnista por formação, Pedro não hesitou em aceitar o apoio do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural da Paraíba (Senar-PB).

A assistência técnica ajudou a aprimorar o manejo dos animais e a profissionalizar os processos da queijaria. “A gente nunca sabe tudo. Aprendi muito com os técnicos e conseguimos padronizar nossa produção com cartilhas e inovações que mudaram nossa rotina”, explica.

Um dos maiores trunfos da fazenda está na escolha da raça murciano-granadina, originária da Espanha. “É um leite que tem rendimento altíssimo. Enquanto outras raças precisam de 12 litros para 1 kg de queijo, com a nossa, usamos apenas 5,5 litros. E o sabor é suave, sem aquele cheiro forte que afasta muitos consumidores”, explica.

Foi assim que nasceram queijos únicos, como o premiado Lua Nova e o autoral Coroa de Frade — este último criado, curiosamente, a partir de um erro de receita. “Na segunda vez que o erro se repetiu, resolvi observar o processo com atenção. Fiz testes, moldei a massa e criei um queijo completamente novo. Hoje, é um dos nossos carros-chefes”, conta com orgulho.

Mais do que produzir queijos, Pedro promove experiências. A fazenda recebe visitantes de todo o Brasil em ações de turismo rural que incluem piqueniques, visitas à sala de ordenha e trilhas pela Caatinga preservada. “Muita gente se emociona quando chega aqui. Elas cresceram ouvindo que o Semiárido não produzia nada. E aqui descobrem exatamente o contrário”, diz.

Para ele, o preconceito com o queijo de cabra é, muitas vezes, um reflexo do preconceito com a própria região. “Na Europa, é o queijo mais valorizado. Aqui, no interior do Nordeste, ainda enfrentamos resistência, mas estamos mudando isso com trabalho, qualidade e afeto. Nosso queijo carrega a alma do Sertão”, resume.

Na semana passada, o assessor em Caprinocultura Geneilson Evangelista, da Gerência Regional da Empaer Campina Grande, realizou o cadastramento de oito criadores em Gado Bravo e, nesta semana, visitou Aroeiras, que também manifesta o desejo de investir ainda mais na criação de caprinos leiteiros, “estimulados pelos incentivos e o preço do litro de leite, que atualmente está sendo comercializado ao preço de R$ 4,80, o que é muito bom”.

Reunidos em Associação, em Gado Bravo, por exemplo, os 10 criadores poderão colocar no mercado até 30 litros diários. “Se constitui em uma boa renda familiar”, comentou. Isso demonstra que a produção de leite e de carne caprina e ovina ganham fôlego no aquecimento da economia no Semiárido da Paraíba.

Destacando o crescimento da caprinocultura com a abertura e funcionamento de abatedouro, como o Capribom, em Monteiro, e as cooperativas que adquirem a produção, os criadores estão cientes de que é rentável investir na criação de cabras.

A Empaer presta assistência técnica junto aos criadores, oferece pesquisa de melhoramento genético e extensão rural para a transformação da cadeia produtiva da caprinocultura.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 8 de julho de 2025.