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Número de fumantes aumenta na PB

publicado: 28/10/2025 08h27, última modificação: 28/10/2025 08h47
Uso de cigarros eletrônicos e influência social impulsionam o crescimento, sobretudo entre jovens adultos
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Grupo da Policlínica de Jaguaribe promove atividades coletivas de sociabilidade e apoio psicológico, para oferecer caminhos para o combate à dependência química | Fotos: Amaro Guimarães e Eliane Rafael/Arquivo pessoal

por Íris Machado*

Em 2024, 7,2% dos paraibanos eram fumantes. A estimativa é que, até o fim de 2025, o índice alcance 8,6% da população. Segundo dados da Secretaria de Estado da Saúde (SES), cerca de 213 mil pessoas estavam incluídas nesse percentual em 2024, e mais de 45 mil devem se somar à estatística neste ano, representando um aumento na casa dos 20%.

O crescimento acompanha a tendência nacional. De 2023 a 2024, pela primeira vez em quase duas décadas, a taxa de fumantes no Brasil subiu 25%, conforme aponta o Ministério da Saúde.

O pneumologista Alexandre Araruna relaciona o aumento principalmente ao uso de cigarros eletrônicos, os chamados “vapes”, especialmente entre os jovens adultos. “Algumas pessoas ainda acreditam na inocência do vapor exalado, que, por não ter odor, estaria livre de complicações. Mas esses vapores contêm substâncias tóxicas que, inaladas continuamente, podem causar inflamações na garganta, nas vias respiratórias e outros problemas que ainda não conseguimos detectar”, explica. 

Araruna destaca ainda que a produção dos vapes não é padronizada. “O cigarro eletrônico não é fabricado de forma industrializada; cada produtor adota um método diferente. Não sabemos exatamente quais produtos são utilizados, mas a ampla maioria envolve compostos da química industrial — muitos deles reconhecidamente associados ao risco de câncer em suas diversas formas”, completou.

Projeção

No Brasil, mais de 174 mil pessoas morrem todos os anos em decorrência de doenças causadas pelo tabaco, segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca). No mundo, o número chega a oito milhões de mortes anuais, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS). O risco atinge tanto os fumantes ativos quanto os passivos, alerta o pneumologista Alexandre Araruna. “O dano maior ocorre no organismo de quem inala diretamente o produto, seja ele qual for. No entanto, o ato passivo de respirar essas fumaças e vapores também é danoso”, explica.

A professora Ana Nunes, de 22 anos, decidiu abandonar o cigarro após perceber que o vício prejudicava sua rotina em sala de aula, provocando crises de tosse seca que não conseguia controlar. Ela começou a fumar aos 17 anos, ainda na adolescência, influenciada pelo ambiente social e por colegas da faculdade.

“Eu fumava só quando bebia e em contextos sociais. Sentia que tinha tudo sob controle, porque só fumava nessas condições, mas chegou um ponto em que eu precisava de um cigarro sempre que saía — e beber virou uma desculpa para fumar”, relata.

Segundo Ana, a facilidade de acesso e o hábito entre amigos contribuíram para a manutenção do vício. “Praticamente todos os meus amigos hoje fumam, seja cigarro tradicional ou eletrônico. É fácil começar, porque sempre tem alguém oferecendo um cigarrinho. Passei a usar mais em um momento complicado da minha vida, e o cigarro virou uma válvula de escape. Mas vendo tanta gente jovem com problemas de saúde por causa do fumo, decidi parar enquanto é cedo”.

Livre do tabaco há três meses, ela reconhece que o processo de superação é contínuo. “A gente nunca para de vez, né? O processo é eterno, porque a vontade não passa”, diz.

Apoio e tratamento

Incentivado pelo pai, o servidor público Amaro Guimarães, de 74 anos, teve o primeiro contato com o cigarro aos 12 anos. Desde então, foram quase cinco décadas de consumo de fumo. “Ele colocou um cigarro na minha boca para tirar uma foto. Queria mandar para o pai dele e dizer que tinha ‘dois filhos homens’. Logo depois, fui estudar em colégios na cidade e, em contato com outros jovens, veio o interesse cotidiano pelo cigarro”, lembra.

Após diversas tentativas sem sucesso de abandonar o vício, Amaro iniciou o tratamento somente depois de sofrer um acidente, ocasião em que foi encaminhado pela esposa a um Centro de Apoio Psicossocial (Caps). Ele relata que fumava duas carteiras por dia e, com o apoio da equipe médica, conseguiu se livrar do cigarro. Há 12 anos sem fumar, afirma não se considerar vitorioso apenas por ter abandonado o vício, mas também por ter se tornado um guerreiro na luta contra o tabagismo.

Autor de três livros sobre o tema, Amaro participa de um grupo antitabagismo na Policlínica Municipal de Jaguaribe, em João Pessoa, e envia mensagens de incentivo aos integrantes. O serviço faz parte do Programa de Combate ao Tabagismo da capital, implantado há mais de 15 anos pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS). Além do acompanhamento psicológico, o tratamento é oferecido por uma equipe multiprofissional composta por assistente social, clínico-geral, nutricionistas, enfermeiros e farmacêuticos.

Durante as sessões, são realizadas dinâmicas em grupo, danças e rodas de conversa. A equipe também promove atividades que integram literatura e arte ao processo terapêutico, como o Chá Literário. A edição mais recente do evento, em alusão ao Dia Nacional de Combate ao Tabagismo, celebrado em agosto, contou com o lançamento do terceiro livro de Amaro, “Em… Um pouco de mim”.

A psicóloga Eliane Rafael, integrante da equipe, explica que o objetivo das ações é estimular a reflexão e incentivar hábitos de vida mais saudáveis. “Utilizamos intervenções terapêuticas que ajudam as pessoas a desenvolver novas estratégias de enfrentamento, enxergar possibilidades e encontrar sentido na vida ao controlar a dependência tabagista. Também administramos medicamentos, quando necessário, para amenizar a síndrome de abstinência, com o uso de adesivos transdérmicos de nicotina”, detalha.

Segundo ela, reestruturar o modo de pensar e acreditar no próprio potencial é o primeiro passo na luta contra o vício. “Compreender que a dependência é uma doença e que há tratamento é fundamental”, afirma. “Além disso, técnicas de respiração, relaxamento e meditação ajudam no combate ao estresse e à ansiedade, reduzindo a compulsão pelo cigarro. Exercitar a fé, praticar atividades físicas, ler e se envolver com a arte também estimulam a dopamina — o neurotransmissor do prazer — e tornam a vida mais alegre e cheia de sentido”.

SUS

O Sistema Único de Saúde (SUS) disponibiliza tratamento gratuito para quem deseja parar de fumar. Para ter acesso, basta ir a uma unidade de saúde que ofereça o serviço. O programa funciona nas Unidades de Saúde da Família (USFs), Caps e policlínicas municipais.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 28 de outubro de 2025.