Mais de mil indígenas, entre integrantes dos povos Tabajara e Potiguara, realizaram, ontem, uma mobilização no km 24 da BR-101, próximo à entrada da Aldeia Silva de Belém, no município de Mamanguape, Litoral Norte da Paraíba. Como parte de uma ação nacional convocada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), o protesto, estendido até o início da tarde, teve como alvo uma medida, aprovada pelo Senado Federal, que pode afetar populações originárias em todo o país. Trata-se do Projeto de Decreto Legislativo (PDL) n° 717/2024, de autoria do senador Esperidião Amin (PP-SC), que suspende o processo de demarcação das terras indígenas Toldo Imbu e Morro dos Cavalos, áreas situadas em Santa Catarina, que já haviam sido homologadas na Justiça.
Segundo o cacique-geral dos potiguaras, Sandro Gomes Feitosa, o PDL ameaça a segurança jurídica de zonas indígenas na Paraíba, tendo em vista que também propõe sustar o artigo 2° do Decreto nº 1.775/1996, que estabelece o procedimento de demarcação de territórios da categoria. “Estamos preocupados com a terra indígena Monte-Mor, que faz parte dos 13 territórios indígenas homologados, no ano passado, no Brasil”, declarou a liderança. “Não podemos aceitar isso, o PDL é um retrocesso em pleno século 21”, acrescentou.
De acordo com o senador Amin, os processos de demarcação das áreas em Santa Catarina ferem as novas regras da Lei nº 14.701/2023, uma vez que não teria contado com a participação de estados e municípios e não se adequa ao chamado marco temporal, segundo o qual só podem ser reivindicadas terras indígenas que estavam sob posse ou disputa na data da promulgação da Constituição, em 1988.
Por sua vez, a Apib alega que a lei altera os direitos dos povos indígenas garantidos pela Carta Constitucional e já foi considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em 2023. Para a entidade, a aprovação do novo projeto, que segue para votação na Câmara dos Deputados, oferece riscos, como conflitos fundiários, o descumprimento de tratados internacionais e ameaças ao meio ambiente.
Reconhecimento
Na Paraíba, os Potiguara têm o amparo das prefeituras de Baía da Traição, Marcação e Rio Tinto, que forneceram pareceres favoráveis ao reconhecimento de Monte-Mor. “As gestões Municipais e Estadual têm nos apoiado nessa luta. Afinal, temos que garantir o nosso território, para que a nossa família e as futuras gerações possam tirar o sustento da terra e morar nela, afirmando a cultura e a ancestralidade”, destacou o cacique-geral.
A secretária de Estado da Mulher e da Diversidade Humana (Semdh), Lídia Moura, considerou legítima a mobilização de ontem. “A territorialidade representa esse lugar de cultura e religiosidade, para além da moradia”, avaliou a titular da Semdh, lembrando que o Governo da Paraíba oficializou, junto ao Governo Federal, o reconhecimento de Monte-Mor como terra indígena. “A Semdh trabalha em defesa dos direitos dos povos indígenas, não apenas em políticas públicas, mas também na garantia dos seus territórios”, frisou.
Luta na Justiça
Ao lado dos Potiguara na manifestação em Mamanguape, representantes dos Tabajara chamaram atenção para a luta que vêm travando para a demarcação de suas próprias áreas no estado. Como explica a antropóloga e líder indígena Jacy Tabajara, as terras Tabajara abrigam quatro aldeias, localizadas no município de Conde. “Estamos há dois anos participando de audiências na Primeira Vara da Justiça Federal, em busca do reconhecimento. Demarcar território indígena é garantir sustentabilidade para as futuras gerações, não apenas dos povos tradicionais, mas de toda a humanidade”, enfatizou.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 10 de junho de 2025.