O mundo está vivenciando tempos de altas temperaturas. O ano de 2023 foi o mais quente já registrado no planeta nos últimos 100 mil anos, segundo o Serviço de Mudanças Climáticas Copernicus (C3S), da União Europeia. O mesmo serviço também anunciou o mês de janeiro deste ano como sendo o de maior calor já registrado pelo C3S desde 1950. Com tanta mudança, a população, sobretudo os trabalhadores, tem de se adaptar.
O aumento da temperatura traz transformações estruturais na sociedade, com a multiplicação de ambientes climatizados e mudanças de hábitos como maior ingestão de água e sucos, ou procurar fazer atividades ao ar livre sempre em horários de temperatura mais amena.
Mas quando se trata de trabalho, muitos profissionais não têm escolha e precisam se expor ao sol, algumas vezes por horas a fio. Isso obriga os profissionais e empregadores a tomar medidas para garantir que o tempo laboral não se torne prejudicial à saúde.
“Às vezes eu chego em casa com dor de cabeça, mal-estar e enjoo”, revelou o mestre de obras José Márcio. Ele culpa o calor e o forte sol a que costuma se expor durante o trabalho, já há 12 anos, e lembra que nesse tempo as condições de trabalho já mudaram bastante. Os kits de proteção costumavam ser capacetes, luvas e botas. Hoje, ganharam bonés com proteção para o pescoço e nuca, óculos escuros, roupas térmicas e cremes com fator de proteção solar (FPS).
Essa realidade se reproduz em várias outras profissões, como agentes de trânsito, vendedores ambulantes, agricultores e agentes de limpeza urbana, como é o caso de Ednaldo da Silva, funcionário da Autarquia Especial Municipal de Limpeza Urbana (Emlur) há pouco mais de um ano, em João Pessoa.
Ednaldo trabalha na área das praias e disse usar boné com proteção de pescoço, camisa com FPS, óculos escuros e passa protetor solar de duas a três vezes por dia. “Quando suamos, é preciso renovar o creme”, explica.
Essa é a indumentária que passou a ser indispensável para os trabalhadores queficam expostos ao sol. “A exposição prolongada ao sol pode causar desde manchas na pele até ocasionar lesões pré-malignas ou câncer de pele”, explica a dermatologista Flávia Estrela Maroja Marinho.
Especialista alerta para uso de roupa com proteção ultravioleta
A dermatologista Flávia Estrela Maroja Marinho frisou que aqueles profissionais que estejam em exposição prolongada devem usar fotoproteção em loções com fator de proteção igual ou superior a FPS 30, além de equipamentos de proteção individual como óculos com filtro ultravioleta, chapéus e roupas com proteção ultravioleta.
Ela alerta ainda que “idealmente, devemos evitar exposição ao sol em horários onde a radiação ultravioleta se encontra nos maiores patamares, como, por exemplo, após as 10h e antes das 16h”.
Exposição prolongada
- Profissionais submetidos à exposição solar devem usar fotoprotetor com FPS 30 ou mais - Foto: Roberto Guedes
Outro ponto que necessita de atenção daqueles que se expõem ao sol por muitas horas, são os olhos. “Estudos mostram que as diferentes estruturas do olho humano absorvem a radiação ultravioleta (R-UV) de modo distinto. Na córnea e conjuntiva, são comuns fotoceratite e fotoconjuntivite. Nas pálpebras, cristalino e retina, carcinomas, catarata, pterígio e degeneração macular relacionada à idade”, enumerou a professora de Oftalmologia Aganeide Castilho-Palitot.
A oftalmologista disse que devem ser usados óculos com proteção aos raios UVA e UVB, “pois nem todos os óculos solares bloqueiam totalmente a radiação”. E fez o alerta de que os problemas oculares estão relacionados à exposição solar cumulativa, ou seja, a fotoproteção ocular deve ser iniciada ainda na primeira infância.
No caso de Ednaldo, todos os equipamentos de proteção são oferecidos pela instituição onde ele trabalha. E é assim que deve ser, como explica o advogado especialista em questões trabalhistas, Felipe Mendonça. A exposição ao sol, por si só, não é considerada pela lei, insalubre, mas tanto a Constituição Federal quanto a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) garantem medidas de proteção aos trabalhadores.
Normas do Ministério do Trabalho
- Existem também Normas Regulamentadoras feitas pelo Ministério do Trabalho e Emprego que deixam claro que o fornecimento de equipamentos de proteção (EPI) por parte da empresa aos trabalhadores é obrigatório.
- O descumprimento de alguma dessas medidas protetivas por parte dos empregadores, pode gerar penas administrativas e judiciais. “Caso o Ministério do Trabalho fiscalize e encontre alguma irregularidade, será lavrado um auto de infração com valores que variam em decorrência do número de trabalhadores envolvidos”, explicou.
- Mendonça chamou atenção para o fato de que o trabalhador pode, inclusive, entrar com uma reclamação trabalhista na Justiça do Trabalho contra o empregador, e exigir uma indenização.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa de 18 de fevereiro de 2024.