- Nascido em Umbuzeiro, político morreu, aos 76 anos, na cidade de Petrópolis (RJ) | Foto: Divulgação/Memorial TJPB
Hoje, a Paraíba e o Brasil celebram os 160 anos de nascimento de Epitácio Pessoa, o único paraibano a ocupar a Presidência da República. Nascido no interior do estado, ele superou os obstáculos da infância e da seca nordestina para escrever seu nome na história política nacional.
Mais do que um acontecimento importante, a data convida à reflexão sobre o papel de Epitácio como jurista, estadista e símbolo de uma época marcada por transições — da monarquia à república, da política dos coronéis às primeiras manifestações populares por direitos sociais.
“Epitácio foi, durante a República Velha, o principal nome da política da Paraíba e um dos mais importantes no âmbito nacional. Iniciado na política paraibana como secretário do primeiro governo republicano, logo depois teve destacada participação na Câmara Federal como opositor do presidente Floriano Peixoto”, conta o escritor e historiador Flávio Ramalho de Brito.
Com passagem marcante pelo Supremo Tribunal Federal e por missões diplomáticas internacionais, Epitácio foi o escolhido das elites para disputar a presidência, em 1919, vencendo as eleições de forma indireta, enquanto ainda representava o Brasil na Conferência de Paz de Versalhes, na França.
As eleições ocorreram em 13 de abril de 1919, e o paraibano obteve 249.342 votos, contra 118.303 dados ao adversário, Ruy Barbosa. Assim, de forma repentina, em Paris, Epitácio Pessoa viu seu status político transformar-se de chefe da delegação brasileira para chefe de Estado.
“Eleito presidente da República, desenvolveu um grande programa de obras para o Nordeste. A sua ação governamental na Paraíba mereceu de José Américo de Almeida uma obra magistral: ‘A Paraíba e seus problemas’”, aponta Flávio Ramalho.
Epitácio Pessoa foi o 11o presidente do Brasil, governando até 1922. Seu mandato foi marcado por revoltas militares, que culminaram na Revolução de 1930. Por isso, sempre que o militarismo tenta extrapolar os limites constitucionais, a figura de Epitácio Pessoa é lembrada. “Quando presidente da República — apesar da reação dos quartéis —, Epitácio Pessoa, pela primeira vez na história do Brasil, nomeou civis como ministros militares”, destaca o historiador Flávio Ramalho.
O espírito de liderança de Epitácio na Presidência é evidenciado nas palavras do jurista Hermes Lima, recuperadas por Flávio Ramalho: “Sua presença no governo dava a sensação de alguém que ocupava, literalmente, a dimensão toda da Presidência. O topete de não deixar acusação sem resposta, a iniciativa das obras no Nordeste, os ministérios militares entregues a civis, a presença viril que compensava a sua fraca base política nacional — tudo nele evocava um feitio de líder”.
Tempos difíceis
O governo de Epitácio Pessoa também foi marcado por desafios profundos: crises econômicas, greves operárias, movimentos sociais e a persistente seca no Nordeste.
O paraibano criou órgãos federais, fortaleceu o Judiciário e investiu em obras públicas, mas também enfrentou críticas pela repressão a movimentos populares e pela manutenção da política de privilégios às oligarquias.
Na Paraíba, deixou marcas simbólicas e materiais: romoveu obras, apoiou lideranças locais e ajudou a projetar o estado no cenário político nacional.
Após deixar a presidência, Epitácio ainda atuou como juiz da Corte Permanente de Justiça Internacional, em Haia, nos Países Baixos.
Do interior aos Poderes: uma história de superação
Epitácio Lindolfo da Silva Pessoa nasceu em 23 de maio de 1865, em Umbuzeiro, no Agreste paraibano. Filho de proprietários de engenho, perdeu os pais aos sete anos de idade, vítimas de varíola, e acabou sendo criado, em Recife, (PE) pelo tio Henrique Pereira de Lucena, o Barão de Lucena, uma das figuras políticas mais influentes do Brasil Império.
Essa trajetória marcou uma infância solitária, dedicada intensamente aos estudos e à leitura. Epitácio cursou o tradicional Ginásio Pernambucano, um dos mais prestigiados da região, e, posteriormente, formou-se na Faculdade de Direito do Recife. Atuou como jurista, professor, diplomata e político, destacando-se, desde cedo, por sua inteligência e oratória.
Sua carreira política começou como deputado federal (1891–1893), pelo Partido Republicano da Paraíba. Em seguida, ocupou diversos cargos de destaque: foi ministro da Justiça e Negócios Interiores (de 15 de novembro de 1898 a 6 de agosto de 1901); ministro interino da Indústria, Viação e Obras Públicas (de 13 de dezembro de 1900 a 25 de fevereiro de 1901); procurador-geral da República (de 7 de junho de 1902 a 21 de outubro de 1905); ministro do Supremo Tribunal Federal (de 29 de janeiro de 1902 a 17 de agosto de 1912); e senador da República (de 3 de maio de 1913 a 28 de junho de 1919 e de 3 de maio de 1924 a 24 de outubro de 1930). Também atuou como chefe da delegação brasileira na Conferência de Paz de Versalhes, em 1919, onde representou o Brasil nas negociações do pós-Primeira Guerra Mundial.
Epitácio Pessoa morreu em 13 de fevereiro de 1942, aos 76 anos, em Petrópolis (RJ).
Justiça paraibana e Senado fazem tributo
Na semana em que se comemoram os 160 anos do nascimento de Epitácio Pessoa, o Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB) e o Senado Federal prestam homenagens ao paraibano, destacando sua trajetória e seu legado.
Em João Pessoa, o TJPB realiza, hoje, uma solenidade no Palácio da Justiça — que abriga o Museu e a Cripta de Epitácio Pessoa —, reunindo magistrados, representantes do Ministério Público, advogados e autoridades estaduais. Durante o evento, que acontece às 10h, haverá uma conferência proferida pela desembargadora federal Margarida Cantarelli.
Ontem, em Brasília, o Senado Federal realizou, a pedido do parlamentar paraibano Efraim Filho (União), uma sessão especial em homenagem ao ex-presidente, ressaltando sua importância para a história política nacional e para a afirmação do Nordeste no cenário republicano. A solenidade reuniu importantes autoridades da esfera nacional.
No discurso de abertura da sessão, Efraim Filho ressaltou a atualidade do legado de Epitácio Pessoa. “Sua grandiosidade não reside apenas nos feitos históricos; reside, sobretudo, na perenidade de seus valores: integridade inabalável e visão de estadista que enxergava muito além do seu tempo, disse.
Paraibano, o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o ministro Herman Benjamin falou que Epitácio Pessoa foi “o homem público mais importante” do estado, uma vez que ocupou cargos nos Três Poderes da República. “Nenhum outro brasileiro conseguiu esse feito. E isso não significa santificá-lo, mas reconhecer seu grande legado”, observou.
Herman Benjamin fez um paralelo entre o passado e os desafios ambientais contemporâneos. Segundo ele, se governasse hoje, Epitácio manteria o foco nos açudes, mas com atenção especial à desertificação e à proteção da Caatinga. “A construção de grandes barragens não resolve, sozinha, o problema. É preciso cuidar da vegetação e das fontes de água. Sem elas, nem o maior açude resolverá a questão. O legado de Epitácio nos convida a olhar o presente com mais responsabilidade”, falou.
Representando a Assembleia Legislativa da Paraíba, o deputado Adriano Galdino enfatizou a relevância histórica de Epitácio Pessoa para a Paraíba e para o Brasil. “É uma alegria imensa estar aqui, nesta justa homenagem ao maior de todos os paraibanos. Epitácio é símbolo de superação, inteligência e compromisso com o povo nordestino. Órfão, enfrentou dificuldades imensas, mas soube transformar conhecimento em instrumento de mudança social e política”, elogiou.
Também participaram da sessão o ministro das Comunicações, Frederico de Siqueira Filho; o embaixador Carlos Alberto Pessoa Pardelas, neto do homenageado; o procurador-geral do Ministério Público de Contas da Paraíba, Marcílio Toscano Franca Filho; e o vereador de João Pessoa Milanez Neto (MDB), representante da Câmara Municipal da capital.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 23 maio de 2025.