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O som é troncho. Ainda bem!

publicado: 22/07/2025 08h24, última modificação: 22/07/2025 08h24

por André Cananéa*

No sábado (19), atendi à convocação do Papangu para ver o grupo mais falado do rock paraibano em ação. Baile Troncho foi o nome do evento que começou britanicamente às 19h, com Hajem Kunk, seguiu com Hazamat e terminou com os anfitriões Papangu, no último show em João Pessoa antes do quinteto paraibano embarcar para a Europa, onde fará uma turnê e irá gravar o terceiro disco da carreira. Baile Troncho integrou o projeto Viva Usina, então eu já sabia que iria assistir aos shows com qualidade de som e luz necessária à força criativa dos artistas escalados. E entrada gratuita!

Apesar da chuva, deu um ótimo público para testemunhar três showzaços. Hajem Kunk é um projeto “troncho” — no melhor sentido da palavra — de Pedro Francisco, integrante do Papangu. A banda mescla a psicodelia dos primeiros anos do Pink Floyd com a sonoridade regional de Hermeto Pascoal e Jaguaribe Carne, em números instrumentais incendiários.

Aliás, sabe o seminal LP Jaguaribe Carne Instrumental de Pedro Osmar e Paulo Ró? Foi gravado por Odair Salgueiro, multi-instrumentista que não só deixou uma obra de inestimável valor, como dois filhos que têm despontado como gigantes da nova música paraibana: o caçula Pedro Francisco e o mais velho Rodolfo Salgueiro, ambos integrantes do Papangu.

E logo após conferir a potência sonora da Hazamat, power-trio que evoca as guitarras barulhentas e a linha melódica do grunge com letras em português (e um cover potente dos Beatles no meio do set), veio a grande atração da noite, Papangu.

Com integrantes que fizeram da Europa um caminho de roça — o baixista Marco Mayer, inclusive, mora lá atualmente —, mas extremamente ligados à cultura regional, o Papangu criou um som incrível unindo jazz fusion e heavy metal experimental, azeitado com elementos profundamente nordestinos a partir do próprio nome (que remete ao carnaval pernambucano do século 19) até os temas presentes nos discos Holoceno (lobisomens, carrancas do Rio São Francisco) e Lampião Rei (boitatá, cangaço).

Os dois álbuns já foram devidamente radiografados pela Parahyba FM através do programa História do Disco (acesse-os através do QR Code desta página), ambos com o guitarrista e vocalista Hector Ruslan, que muito bem definiu o grupo: “A gente sempre se pautou pelo nome Papangu, pela forma como a gente fala, pela forma como a gente não faz maquiagem do nosso sotaque. Temos orgulho de sermos uma banda paraibana”.

E isso se traduz na participação especialíssima dos pifeiros do Cariri, que subiram ao palco do Baile Troncho “entronchando” King Crimson e Emerson, Lake & Palmer com o legado de Zabé da Loca, numa explosão de rock progressivo, jazz e pífanos em “São Francisco” (faixa de Holoceno) — a outra participação da noite foi PriCler, vencedora do Festival de Música da Paraíba deste ano.

No palco desse show, Hector, Rodolfo Salgueiro (voz e teclados), Pedro Francisco (baixo, flauta e brinquedos de borracha), Vitor Alves (bateria) e Rai Accioly (guitarra, vocal) misturaram músicas do primeiro (“Ave-bala”, “Água branca”) e do segundo LP (‘‘Boitatá”, “Oferenda no alguidar”, “Rito de coroação”) com três faixas do próximo disco, que será gravado na Alemanha, em setembro, após uma turnê com 12 datas pelo Reino Unido, Dinamarca, Bélgica, Noruega e Alemanha, começando dia 13 de agosto em Lisboa (Portugal).

Sem revelar o título das canções, Rodolfo adiantou, com exclusividade, que o grupo tem feito muita pré-produção para otimizar o tempo que será usado no estúdio alemão e o quinteto poder reproduzir a sonoridade enfurecida dos shows ao vivo. De acordo com a agenda, eles terão de 10 a 12 dias para registrar o novo álbum.

“Uma outra característica é que a gente pretende fazer o disco o mais analógico possível. Então a gente vai gravar em duas fitas de 27 minutos — aquelas grandonas — em um gravador de 24 canais antigão. E as limitações é que irão gerar a criatividade das gravações”, comentou Rodolfo. E na gravação, Marco Mayer reassume o baixo e Pedro Francisco vai para a guitarra, já que Rai Accioly tem acompanhado a banda apenas nos shows locais.

O material, claro, sairá em LP, além de ser disponibilizado nas plataformas digitais. Aliás, o Papangu já estabeleceu uma linha de merchandising forte. Com uma super parceria com a Taioba Discos (que além de loja, é selo fonográfico), o grupo tem lançado os álbuns em mídia física, incluindo um single em vinil com tiragem limitada, além de bonés e camisetas que já foram vistas até em meio ao público do cantor soul Michael Kiwanuka, no último Lollapalooza Brasil.

Vida longa e voos altos a esses papangus paraibanos.

 Por meio deste link, acesse os programas História do Disco

*Coluna publicada originalmente na edição impressa do dia 22 de julho de 2025.