É sempre assim. Se você não enveredar pelo passado, vai cair naquela velha piada: na aula de história, o aluno deve saber de fatos dos quais nem tinha nascido ainda. O Big Bang e todo o resto do universo surgiu quando você deu a primeira chorada.
Aí vem aquele falatório de que a banda de heavy metal da semana é melhor que os Beatles, ou que assistiu ao primeiro Pânico (1997) somente hoje e só enxergou um monte de clichês do gênero de terror. Pois bem, o mundo não funciona assim.
Outro exemplo é a epidemia de Jungi Ito, um dos maiores nomes dos quadrinhos japoneses (vulgo mangá) da atualidade, focado no âmbito do terror hardcore. De uns cinco anos para cá, houve uma overdose desse autor. Cada editora que se preze tinha o seu Jungi Ito. O que pode ser bom para descobri-lo, o que pode ser ruim para enfastiar do seu estilo.
Antes de Ito, havia o terror de nomes como Kazuo Umezz (1936–1924), que finalmente saiu do anonimato nos registros do ISBN nacional com o primeiro volume de Sala de Aula à Deriva (Devir, 400 páginas). Um quadrinista que influenciou não apenas o badalado Jungi Ito, como também outros nomes que, vez por outra, aparecem nos catálogos de editoras e estantes de livrarias: Suehiro Maruo (de O Vampiro que Ri), Shintaro Kago (Dementia 21) e Hideshi Hino (O Garoto Verme), entre outros.
Considerada seu magnum opus, a obra foi serializada originalmente entre 1972 e 1974, sendo compilada por aqui em seis volumes. Na trama, após um grande terremoto, uma escola primária do Japão desaparece deixando apenas uma grande cratera em seu lugar. Observamos que a instituição foi parar em um cenário pós--apocalíptico, cercada por um vasto deserto. Agora, alunos e professores terão que lidar com o desconhecido, o medo, a fome, a sede e a loucura que, aos poucos, instala-se dentro de seus muros.
Incialmente, há uma estranheza, mas ela vem do estilo de Kazuo Umezz, que mistura o absurdo com o surreal. Para se ter uma ideia, não apenas o Jungi Ito já seguiu claramente seus passos — vide A Sala de Aula que Derreteu (Pipoca e Nanquim) ou Remina, Planeta Demoníaco (Devir) —, como também autores ocidentais, como James Tynion IV e Michael Dialynas com a série A Floresta (também da Devir), uma verdadeira fotocópia de Sala de Aula à Deriva.
Outra característica bastante marcante é o lado psicológico dos personagens às adversidades, o que traz muitos ganchos (afiados) para prender os leitores e as leitoras pela mente.
Um excelente resgate diante da imensa cratera editorial que nos cerca.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 17 de setembro de 2025.