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Tijolo ecológico

Alternativa sustentável na construção

publicado: 29/09/2025 08h59, última modificação: 29/09/2025 08h59
Blocos são fabricados com materiais reciclados, como resíduos de obras, de marmorarias ou, até mesmo, de conchas
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Instalação modular é feita por encaixe e dispensa vigas, pilares e fôrmas de madeira | Foto: Emmanuelle Mesquita/Arquivo pessoal

por Carolina Oliveira*

Na esteira da popularização das práticas sustentáveis na arquitetura e engenharia, o tijolo ecológico vem ganhando espaço na construção civil, setor que, de acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), contribui com aproximadamente 34% das emissões de dióxido de carbono no mundo. A arquiteta especialista em Projetos Sustentáveis Raíssa Matoso explica que a fabricação desse tipo de tijolo é realizada principalmente a partir de uma mistura de solo e baixo percentual de cimento, cerca de 12%. “Os materiais se agregam a partir de um processo de compactação da mistura com o auxílio de uma máquina de prensa, que pode ser manual ou hidráulica”.

Uma outra diferença importante no processo de produção, quando comparado à alvenaria cerâmica de oito furos, é que a etapa de cura da versão ecológica, que corresponde à estabilização dos tijolos, é realizada, conforme descreve a arquiteta, de forma natural, preservando a umidade dos componentes. “Porém, sem o processo de queima, responsável pela alta emissão de gases de efeito estufa”, ressalta a arquiteta.

Apesar de conhecidos alternativamente como tijolos de solo-cimento, existem também tijolos ecológicos feitos com a mesma máquina de prensa, mas que utilizam outros materiais reciclados, como resíduos da construção civil, de marmorarias, e até mesmo de conchas e moluscos, excedentes da mariscagem. “Estas variações já foram testadas e validadas em laboratórios, e preservam as características de alta resistência, além de serem completamente sustentáveis, reutilizando resíduos que seriam descartados”, assegura a profissional.

Além da fabricação, há também redução de desperdício em obra, exigindo menor quantidade de argamassa de assentamento, e menos cimento, pois dispensa reboco, podendo ficar aparente. Quebras desnecessárias para passagem de tubulação e fôrmas de madeira para pilares e vigas também são dispensadas, já que as estruturas passam por dentro dos furos da própria alvenaria, que é modular, ou seja, instalada por encaixe.

Opção pode deixar o preço final da obra até 20% mais barato

À frente de uma olaria especializada na produção destes tijolos, a engenheira civil Emmanuelle Mesquita conta que a Eco Tijolo produz sob demanda, o que ajuda a controlar melhor a qualidade do produto final, e evita desperdício de materiais. Na empresa, que funciona em João Pessoa, no bairro do Roger, o milheiro, ou seja, mil unidades do tijolo, tem o preço de R$ 1.500. “É feito um pedido antecipado, e nós adquirimos com uma jazida a quantidade exata de barro correspondente à demanda da construção, para evitar variações na tonalidade dos tijolos”.

Mil unidades custam, em média, R$ 1.600 no estado | Foto: Emmanuelle Mesquita/Arquivo pessoal

Após participar de uma construção que utilizava o material, Emmanuelle resolveu aprofundar-se na área, investindo em estudos e formação específica e, por fim, no maquinário que possibilitou a atividade da olaria. Com um processo de cura que dura sete dias, o produto da Eco Tijolo pode ser encomendado também por quem quer realizar obras menores. “Além do milheiro, vendemos também a unidade, fazemos o tijolo inteiro, meio tijolo e canaleta”, explica a proprietária.

O milheiro do tijolo ecológico, na Paraíba e em Pernambuco, custa em média R$ 1.600. “Este valor pode assustar inicialmente quem não conhece os benefícios da metodologia construtiva, e todo o potencial de economia, qualidade e beleza que ela proporcionará nas demais etapas da construção”. De acordo com a arquiteta, apesar do valor bem mais caro que a alvenaria convencional, a grande economia vem nas demais etapas da construção.

Ele dispensa quebra-quebra e, com isso, reduz a quantidade de entulhos em obra, tornando, segundo a especialista, desnecessária a contratação de carro de “papa-metralha”. Com a construção modular, também é reduzida a quantidade de argamassa para assentamento. “Apenas um fio de argamassa colante é o suficiente. O tijolo ecológico reduz, ou até mesmo dispensa, o uso de madeirite para fôrmas de estruturas, dispensa emboço, reboco, emassamento e pintura”, acrescenta.

O acabamento do tijolo é apenas rejunte e aplicação de resina impermeabilizante. De acordo com a arquiteta, a durabilidade é maior do que a de uma pintura. “Ou seja, menos manutenção e mais economia. Ao longo da minha experiência com o material, observo uma economia de 10% a 20% no valor total da obra com tijolo ecológico, quando comparada a uma convencional”, observa.

Comparativamente, Raissa estima que, apenas considerando a etapa de alvenarias, a economia seja de 35%. Ela explica que o público que procura construir com esses insumos e métodos é formado por pessoas que têm um olhar para a sustentabilidade. “Estão abertas à inovação, gostam de pesquisar e preferem construir de forma diferente da convencional, que pode ser custosa e gerar desperdício e maior impacto ao meio ambiente”.

Em expansão: nicho registrou crescimento de 40% em 2023

Além daqueles que buscam economia e maior praticidade na hora de construir, a arquiteta destaca que, algumas pessoas escolhem o material por gostarem da estética do tijolo ecológico. “Os clientes que optam pelo tijolo ecológico costumam ficar satisfeitos com o resultado. Até porque ainda tem um benefício a mais, que é o aumento do conforto térmico e acústico”, observa.

Morador e proprietário de uma casa que teve em sua construção o uso deste tijolo, o administrador de empresas José Carlos de Oliveira relata que, ao pensarem na obra, inicialmente, ele e sua esposa, Maruza, não planejavam seguir esse caminho. “Tínhamos inclusive, um projeto para construção com utilização de tijolos cerâmicos. Conhecemos esse material e os métodos de construção sustentáveis quando visitamos um colega de trabalho no município de Chã Grande, e ficamos encantados com a estética e o projeto da casa”. 

Além de reduzir impactos ambientais, o material proporciona estética atrativa, conforto térmico e boa acústica | Foto: Morgana Nunes/Arquivo pessoal

Considerando a relevância dos gastos com os elementos estruturais no preço total da obra, José Carlos conta que houve redução expressiva dos dispêndios com cimento, areia, brita e ferro. “Sem levar em conta as perdas inerentes ao uso desses materiais, também houve redução no custo final da obra, estimado em torno de 20%, e que poderia ter sido maior, se não tivéssemos rebocado e emassado as áreas internas, o que era opcional”, avalia.

Para além da economia, e menor impacto ambiental, com redução da quantidade necessária de materiais para a estrutura da edificação, e quase nenhum resíduo, segundo o casal, o destaque fica ainda para a beleza e funcionalidade da casa. “O resultado estético é muito mais agradável, objeto de admiração de amigos e vizinhos”, concordam.

A arquiteta conta que o nicho da construção sustentável teve um crescimento estimado pelo Green Building Council Brasil (GBCB) em 40% no ano de 2023, destacando que ainda há espaço para crescimento, tratando-se de um setor em expansão, com mais pessoas interessadas na técnica do que profissionais preparados para atendê-las.“Na minha empresa, por exemplo, muitas vezes, há ‘fila de espera’ de clientes. Eles aguardam de um a dois meses para iniciar um projeto”, relata.

Sobre o trabalho com projetos sustentáveis, Raissa conta que os processos e metodologias vão além da mera especificação de um material. “Há todo um pensamento construtivo por trás de cada projeto, para aproveitarmos ao máximo as potencialidades do tijolo, pensar em captação e reuso de água de chuva, energia solar, arquitetura bioclimática, paisagismo regenerativo, saneamento ecológico, entre outras tecnologias sustentáveis. Ter acesso a estas soluções não é apenas para alguns, todas são viáveis economicamente, e um dos pilares dessa abordagem é que precisa também ser sustentável para o bolso”, avalia.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 28 de setembro de 2025.