Dos 100 profissionais ambulantes inscritos para atuarem na parte calçada da orla de Tambaú e Cabo Branco, 84 estavam adequados ao Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) assinado em 2023 para ordenar o comércio e a oferta de serviço na área. Dos 100 inscritos para atuar nas areias, apenas quatro enquadravam-se nas exigências legais. A informação foi repassada pelo Secretário de Desenvolvimento Urbano de João Pessoa, Marmuthe Cavalcanti, durante entrevista coletiva realizada ontem, na sede do Ministério Público da Paraíba (MPPB), no Centro da capital. No último fim de semana, os trabalhadores informais protestaram na orla da capital contra a decisão de retirar os ambulates das ruas, em cumprimento às determinações do TAC. Eles cobram mais apoio do poder público.
O evento foi convocado pelo MPPB para, nas palavras da promotora de Justiça Cláudia Cabral, “prestar contas da verdade” sobre o processo de ordenamento do comércio informal na orla, com base no TAC firmado entre o Ministério Público, o município de João Pessoa e outros órgãos públicos, há quase dois anos. Segundo a promotora, o acordo, celebrado em 14 de julho de 2023, não cria novas regras, mas apenas aplica a legislação já existente no município para garantir o uso sustentável da zona costeira, respeitando os princípios de proteção ambiental e urbanística. “O TAC não é uma inovação. Ele traz o que já está na lei. Nossa orla precisava de reordenamento, e isso foi construído com diálogo e responsabilidade. Ninguém foi pego de surpresa”, afirmou Cláudia Cabral.
Ela destacou que as cláusulas do TAC foram debatidas em diversas reuniões, inclusive com a Associação de Ambulantes. “Hoje, estamos tratando especificamente da situação dos ambulantes. O que foi acordado é que o comércio ambulante pode existir, mas deve respeitar regras claras: sem pontos fixos, sem fontes de calor, sem uso de equipamentos elétricos, sem ocupação das ciclovias, praças ou áreas de restinga”, detalhou.
A promotora também enfatizou que muitos ambulantes continuam operando de forma irregular, com carrinhos fixos e aparelhos que colocam em risco a segurança dos frequentadores da orla e degradam áreas ambientalmente protegidas. “Isso já extrapola a esfera administrativa e entra no campo do crime ambiental, previsto no artigo 60 da Lei de Crimes Ambientais”, alertou.
Durante a coletiva, o secretário Marmuthe Cavalcanti também reiterou que o município tem mantido o diálogo com os ambulantes e oferecido alternativas para regularização. “Não queremos afastar ninguém, queremos organizar. Publicamos editais, fizemos reuniões, promovemos cadastros, mas nem todos quiseram se adequar. A operação realizada no fim de semana foi planejada, educativa, sem violência. Aliás, o único ferido foi um agente público que levou uma pedrada”, disse. Marmuthe também destacou que o ordenamento da orla é uma demanda coletiva. “Estamos falando de um espaço público que precisa estar acessível a todos: idosos, crianças, pessoas com deficiência, atletas, moradores e turistas. O calçadão não pode ser transformado em uma feira”, pontuou.
O TAC traz normas para barracas e quiosques; comerciantes ambulantes; locação de mesas, cadeiras e sombreiros; comércio de passeios aquáticos; atividades esportivas; artistas de rua; catadores de materiais recicláveis; panfletagem e publicidade; locação de brinquedos e festas de Reveillon. Em relação, especificamente ao comércio de ambulantes no local, o TAC proíbe o uso de botijões de gás, churrasqueiras, fornos e fritadeiras na faixa de areia e no calçadão, bem como a instalação de estruturas como mesas, cadeiras, sombreiros e brinquedos — salvo em casos específicos previamente autorizados, como locadores fixos cadastrados. Os ambulantes também devem portar crachá e autorização da prefeitura. O descumprimento pode acarretar apreensão imediata da mercadoria. “Nosso compromisso é com a sociedade, com a cidade e com o meio ambiente. Não estamos aqui contra os trabalhadores. Estamos aqui pela legalidade e pelo uso justo do espaço público”, resumiu a promotora.
Ambulantes reclamam de falta de diálogo e apoio
Dois dias após o protesto que bloqueou o letreiro do Busto de Tamandaré, no coração da orla de João Pessoa, a presidente da Associação dos Ambulantes e Trabalhadores em Geral da Paraíba (Ameg), Márcia Medeiros, cobrou mais escuta e apoio do poder público na implementação das regras previstas no Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) que regula o comércio nas praias de Tambaú e Cabo Branco.
A manifestação dos ambulantes ocorreu em resposta à ação de retirada de trabalhadores realizada pela Prefeitura na noite do último sábado (6). Para os trabalhadores informais, o problema não está na existência de regras, mas na falta de condições reais para cumpri-las.
“É preciso pensar que estamos nos preparando para a formalidade. Não é falta de vontade. Todos nós queremos ser formalizados, ter estrutura adequada. Mas fazemos parte de uma parcela da sociedade mais humilde, que não tem condições de, simplesmente, amanhecer formalizada”, afirmou Márcia à reportagem do jornal A União. Segundo ela, que não foi convidada para a coletiva de imprensa, os custos para os adequar-se são altos e, para muitas famílias, representam o dinheiro da feira ou da conta de luz.
A presidente da Ameg reconhece os avanços que o TAC pode trazer para a organização da orla, porém pede mais sensibilidade no processo. “É louvável cadastrar os profissionais, padronizar o uso do espaço, organizar a orla. Isso não questionamos. Nós só queremos que reflitam sobre essas normas”, afirmou. Um dos pontos mais criticados pelos ambulantes é a proibição do uso de fontes de calor. “Como você vai chegar para um vendedor de milho, que vende o produto há 18 anos, e dizer que ele não pode vender mais o milho no local, porque não pode ter fogo?”, questionou.
Ela relata que muitos profissionais investiram tudo o que tinham em seus equipamentos e que a proibição repentina do uso de carrinhos e botijões de gás significa a perda do sustento. “Não adianta proibir e mandar a gente se adequar, sem oferecer estrutura, apoio e investimentos”, reforçou.
Apesar das justificativas oficiais do MPPB e da Prefeitura, Márcia Medeiros destaca que o diálogo precisa ser mais efetivo e que as soluções precisam levar em conta a realidade de quem vive do comércio informal. “Nós não somos contra a organização, queremos ser parte dela. Mas é preciso construir isso com a gente, não contra a gente”, concluiu.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 9 de julho de 2025.